Um
frescor suave desperta a minha mente, meus ouvidos se abrem para o universo
exterior a todos os vagos pensamentos; ao passo que minhas pálpebras tremulam
sob o ir e vir de minha consciência. Meu espírito se enche de um contentamento
abstrato, percebo então a melodia doce lá fora: é a chuva energizando meu novo
dia.
Aos
poucos a casa transparece vida, posso ouvir as palhas da velha vassoura roçando
o chão e o toc-toc da bengala enquanto minha avó anda; ah, como esse som
pacifica minha alma... O ruído seco de ferro e borracha em atrito com o chão me
eleva a uma atmosfera onde a gravidade inexiste, onde tudo voa e se sacode com
a liberdade que só a ausência de peso pode proporcionar, onde os temores e
dissabores transformam-se em pontos de luz pequenos e distantes que se esvaem
por entre meus dedos... Uma atmosfera onde resplandece a presença de um
espírito santo que me faz lembrar, mais uma vez, por que estou aqui.
O
céu cinzento com ares de preguiça tenta em vão esconder o sol; mesmo que ele
conseguisse, eu ainda teria de me levantar e sair desse santuário de
recolhimento que se tornou o meu quarto. A própria cama parece inflar-se na
tentativa de me fazer erguer o corpo, meus dedos dormentes delatam o já
conquistado hábito de dormir com a mão travada em torno do objeto de proteção;
espero não ter problemas com isso algum dia, já tenho L.E.R. o bastante para
uma só criatura.
Palavras
soltas fluem como minha respiração, são trechos dos muitos textos longos que
irei escrever por toda a minha vida. É uma pena que a maioria não resista tempo
suficiente para que seja materializada no papel; as palavras dispersas, assim
como os pensamentos, não ficam suspensas no ar à espera de alguém que vá
colhê-las... Elas se vão e deixam um rastro ardente de saudade para quem as
tentar aprisionar.
Fico
pensando se todas as pessoas que escrevem possuem esse dom de produzir palavras
ao acaso, de portar em si uma fábrica de pensamentos curtos e ligeiros que
surgem não se sabe de onde nem por quê. É muito satisfatório descobrir
habilidades que não são apenas minhas, desafios que qualquer um iria aceitar,
suplícios que todos podem suportar... Há uma infinidade de pessoas que buscam
diferenciar-se das demais, tencionam ser especiais, únicas, um destaque em meio
à multidão; mas a verdade é que às vezes, se não sempre, é meio solitário ser o
diferencial.
Uma
pessoa admirada, detestada ou seja lá o que for, por todos e compreendida por
ninguém pode até “fazer história” e jamais ser esquecida... Mas conseguirá
atingir o ápice da vida e ser absolutamente feliz? Outra grande verdade é que
todos, inclusive Deus, necessitam de um semelhante.
Os
pequenos respingos já se tornaram grandes gotas de chuva, uma última olhada
pelo quarto faz com que eu me depare com os contornos do filtro de barro, velho
companheiro... Apesar dos constantes protestos e acusações de feiúra ele ainda
está ali, e eu o acho lindo; aquele “achar” que vem muito menos do cérebro do
que do coração. Por trás desses contornos há uma sombra amiga que não se esvai
sob a pressão das horas... O dia finalmente me recebe, com braços que haviam
sido estendidos desde os meus primeiros espasmos intelectuais e que já estão
prontos a me conduzir até o berço da noite.
Adorei o blog... Sou leitor agora! =]
ResponderEliminarParabéns!
Obrigada, me sinto honrada por isso. :)
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