OBJETO
DA LINGUÍSTICA
1. A LÍNGUA: SUA DEFINIÇÃO
Qual é o objeto, ao mesmo tempo integral e concreto, da Linguistica? A questão é particularmente difícil: veremos mais tarde por que. Limitemo-nos, aqui, a esclarecer a dificuldade.
Outras ciências trabalham com objetos dados previamente e que se podem considerar, em seguida, de vários pontos de vista; em nosso campo, nada de semelhante ocorre. Alguém pronuncia a palavra nu: um observador superficial será tentado a ver nela um objeto linguistico concreto; um exame mais atento, porém, nos levará a encontrar no caso, uma após outra, três ou quatro coisas perfeitamente diferentes, conforme a maneira pela qual consideramos a palavra: como som, como expressão duma ideia, Como correspondente ao latim nudum etc. Bem longe de dizer que o objeto precede o ponto de vista, diríamos que e o ponto de vista que cria o objeto; aliás, nada nos diz de antemão que uma dessas maneiras de considerar 0 fato em questão seja anterior ou superior às outras.
Além disso, seja qual for a que se adote, o fenômeno linguístico
apresenta perpetuamente duas faces que se correspondem e das quais uma não vale senão pela outra. Por exemplo:
1° As sílabas que se articulam são impressões acústicas
percebidas pelo ouvido, mas os sons não existiriam sem os órgãos vocais; assim, um n existe somente pela correspondência
desses dois aspectos. Não se pode reduzir então a língua ao som, nem separar 0 som da articulac;;ao vocal; reciprocamente, não se podem definir os movimentos dos órgãos vocais se se fizer abstração da
impressão acústica.
2° Mas admitamos que o som seja uma coisa simples: é ele quem faz a linguagem? Não, não passa de instrumento do
pensamento e não existe por si mesmo. Surge daí uma nova e temível correspondência: o som, unidade complexa acústico-vocal, forma por sua vez, com a ideia, uma unidade complexa, fisiológica e mental.
E ainda mais:
3° A linguagem tem um lado individual e um lado
social, sendo impossível conceber urn sem o outro. Finalmente:
4° A cada instante, a linguagem implica ao mesmo tempo um sistema estabelecido e uma evolução: a cada instante, ela é uma instituição atual e um produto do passado. Parece fácil, à primeira vista,. distinguir entre esses sistemas e sua história, entre aquilo que ele é e o que foi; na realidade, a relação que
une ambas as coisas é tao íntima que se faz difícil separá-las. Seria a questão mais
simples se se considerasse o fenômeno linguistico
em suas origens; se, por exemplo, começássemos por estudar a linguagem das crianças? Não, pois é uma idéia bastante falsa
crer que em matéria de linguagem o problema das origens difira do das condições permanentes; não se sairá mais do círculo
vicioso, então.
Dessarte, qualquer que seja o lado por que se aborda a questão, em nenhuma parte se nos oferece integral o objeto da Linguística. Sempre encontramos o dilema: ou nos aplicamos a um lado apenas de cada problema e nos arriscamos a não perceber as dualidades assinaladas
acima, ou, se estudarmos a linguagem sob vários aspectos
ao mesmo tempo, o objeto da Linguistica nos aparecerá como um aglomerado confuso de coisas heteróclitas sem liame entre si. Quando
se procede assim, abre-se a porta a várias ciências – Psicologia, Antropologia, Gramática normativa, Filologia etc. – , que separamos claramente da Linguística, mas
que, por culpa de um método incorreto, poderiam reivindicar a linguagem como um de seus objetos.
Há, segundo nos parece, uma solução para todas essas dificuldades: é necessário
colocar-se primeiramente no terreno da língua e tomá-la como norma de todas as outras manifestações da linguagem. De fato, entre tantas dualidades, somente a
língua parece suscetível duma definição autônoma e fornece um ponto de apoio satisfatório para o espírito.
REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
SUPERINTERESSANTE.
Antes da Torre de Babel. Revista
Superinteressante. São Paulo, n° 033. 1990.
SAUSSURE,
Ferdinand de. Curso de Linguística Geral.
28ª Ed. São Paulo: Cultrix, 2.000.
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